sábado, 29 de janeiro de 2011

A Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande




Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande], ca. 1865?]

SILVA, Francisco Augusto Nogueira da, 1830-1868
[Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande] [Visual gráfico / Nogueira da Silva ; [grav.] Alberto. - [S.l. : s.n., ca. 1865?]. - 1 gravura : madeira, p&b. - Data provável baseada no período de actividade dos autores. - Dim. da comp.: 7,5x25,1 cm (Biblioteca Nacional)

A Real Fábrica de Vidros da Marinha Grande surge na sequência do encerramento da manufactura de Coina. A falta de combustíveis nesta região levou John Beare, seu administrador na altura, a transferir, em 1748, a tecnologia de Coina para a Marinha Grande, dada a abundância de matérias-primas, a areia, e de carburante nesta região, a lenha do Pinhal do Rei.
No dicionário geográfico, um manuscrito de 1758 é referido que “ há dentro desta vila e freguesia de Coina uma fábrica real que foy de vidro, a qual se acha damnificada e sem exercício há dês anos a esta parte por se mudar a mesma para o lugar da Marinha, termo da cidade de Leyria, e por este dezamparo se lhe perdem as madeiras que sam excellentes”.[1]
John Beare terá tido dificuldades em manter a unidade manufactureira em laboração. Em 1762, num relatório datado de 9 de Setembro, são descritos todos os problemas resultantes da instalação da Real Fábrica na Marinha.
Nesse relatório é referido uma Resolução Real de 23 de Agosto de 1749 para que fosse extinta a Real Fábrica devido aos grandes estragos ocasionados no Pinhal. A fábrica é acusada de consumir a melhor madeira, numa época em que toda a madeira de boa qualidade era enviada para a Ribeira das Naus, em Lisboa, para ser utilizada na construção naval. Além disso é acusada de ser responsável pela subida do preço pago aos carreiros. Estes preferem trabalhar para a Fábrica por um salário certo do que para o Estado.
Não conseguimos saber qual a data de encerramento da fábrica de Beare. No entanto, pensamos que em 1762 ainda se encontrava a laborar.
Em 1769 a administração da Fábrica é pertença de Stephens. Num documento dos Juízes do Officio de Vidraceiro é referido que apenas é permitido a Stephens “… a venda do dito vidro attacado, como sempre executara o seu antecessor Duarte Campeão”, pelo que é provável que depois de Beare, a Fábrica tenha tido outro(s) administradores .[2]
De facto, foi no ano de 1769 que o rei D. José I, por iniciativa do ministro Marquês de Pombal, chamou à corte o industrial inglês Guilherme Stephens. Nesse mesmo ano a família Stephens instalava-se na Marinha Grande e iniciava a construção da Real Fábrica de Vidros, segundo projecto do próprio Guilherme Stephens. Foi no ano de 1770 que com a colaboração de operários vidreiros vindos de Génova e alguns portugueses, se iniciou a produção de vidro de embalagem e vidraça.
         Marquês de Pombal concedeu-lhe um “ empréstimo de 32 contos de réis, sem juros nem limite de tempo, podendo fazer os pagamentos parciais em cal para obras do Estado, dos fornos que possuía em Alcântara”[3] D. José deu-lhe permissão para “gastar toda a lenha do pinhal do estado, que lhe fosse precisa para a fábrica, durante 15 anos, privilégio que se tornou, depois, permanente, segundo alvará de 7-VII-1769”[4]. Mais tarde, declarou que a fábrica ficava sob protecção real, sendo considerada como útil ao bem público e ao dos pinhais.
         A actividade de Guilherme Stephens repercutiu-se na formação dos empregados, na criação e manutenção de certas estruturas que foram essenciais ao desenvolvimento da Marinha Grande, principalmente vias de comunicação, tendo tido, também, um papel importante no desenvolvimento agrícola. A Fábrica funcionou como uma “escola”, “permitindo aperfeiçoar e consolidar um saber-fazer que, nessa segunda fase (1889-1930), já constituía um forte atractivo para a instalação de novas unidades vidreiras”[5]. Já em 1776 numa reclamação dirigida à Rainha D. Maria I, Guilherme Stephens se queixa da concorrência que lhe é feita pelos alemães que têm lojas de vidro na cidade de Lisboa e afirma que “Os lapidários e floristas do vidro nacionais, que foram ensinados na Fábrica, me certificam que podem lapidar e abrir flores em quanto vidro desta qualidade o Reino precisar; pelo que (…)seria útil proibir-se o despacho, na Alfândega, de todo o vidro que vier de fora do Reino, lapidado ou com flores, exceptuando-se os espelhos e lustros, para a manufactura dos quais a Fábrica ainda não tem oficiais capazes”.[6]
         A Fábrica marinhense vai procurar dificultar a saída dos vidreiros que habilitou, recorrendo ao poder central para que este tome medidas. José Amado Mendes (1993) cita o provedor da comarca de Leiria que, em 1812, declara:”O administrador da Fábrica dos Vidros, situada na Marinha Grande (…) exige de mim, juiz conservador dela, providências prontas contra a ruína que se lhe vai seguir, da deserção que da mesma fazem operários, que se retiram para algumas das semelhantes fábricas edificadas em Lisboa, em virtude de aliciações que por parte destas lhes são feitas (…)”. Nos finais do XIX continuava a ver-se ameaçada pela concorrência quanto à mão-de-obra, agora pelas fábricas instaladas na própria Marinha Grande.
         Após a morte de Guilherme Sephens a fábrica passou a ser administrada pelo seu irmão, João Diogo, que, apesar de algumas dificuldades, nomeadamente durante as invasões francesas, manteve um extraordinário desenvolvimento e progresso. Em 1826, João Diogo faleceu deixou em testamento a Fábrica à “Nação Portuguesa”.
         Demoraria cerca de dois anos até que o governo decidisse que, não tendo capacidade para administrar a Fábrica, iria abrir concurso para a sua exploração. Entre 1827 e 1919 a Fábrica conheceu vários arrendatários e tempos de prosperidade, realizando grandes projectos que desenvolveram tecnologicamente a Fábrica, produzindo vidro de grande qualidade, e períodos de grandes dificuldades, chegando mesmo a encerrar e os trabalhadores terem de procurar emprego na construção de estradas ou limpezas do pinhal.
         Em 1919 o Governo decide iniciar a sua exploração através de Comissões Administrativas. Destaca-se o período (1928-1966) em que a administração esteve a cargo do Engenheiro Acácio Calazans Duarte. Além do grande desenvolvimento tecnológico que deu à Fábrica, passou a ser obrigatório a formação dos aprendizes dos sectores de decoração, pelo menos em desenho e a frequência da escola nocturna da Fábrica, pelos menores analfabetos que ali trabalhavam. 
         A partir de 1954 um novo regulamento reformula a Fábrica, transformando-a num centro de desenvolvimento da indústria vidreira. Passou a designar-se Fábrica Escola Irmãos Stephens. Fabricava cristalaria de qualidade, desenvolveu a vertente artística do vidro, tendo contado com algumas parcerias, entre elas, com a Escola Nacional de Belas Artes. Em 1957 passou a ser superintendida pelo Instituto Nacional de Investigação e em 1977 passaria a Empresa Pública, conhecendo várias administrações até ao seu encerramento em 1992. Em 1993 foi adquirida pelo dinamarquês Jorgen Mortensen e reactivada. Actualmente já não de encontra em laboração.








       Pátio da Fábrica-Escola Irmãos Stephens (FEIS) – Ao fundo o palacete que foi habitado pelos Stephens. À Direita, o edifício dedicado à administração (construções do século XVIII).

Jéssica e Ana Agapito – alunas do 11º ano


[1] http://grandemarinha.blogspot.
[2] Idem
[3] http://visitasvirtuais.orelhas.pt/museuVidro/
[4] Idem
[5] José M. Amado Mendes (1993).  A História da Marinha Grande-Introdução e Perspectivas,  Câmara Municipal da Marinha Grande.
[6] Idem

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